Imagem de capa: SunKids/shutterstock
O cabelo está embaraçado e o nó cisma em atrapalhar. Dói fininho quando alguém que a gente gosta vai embora. Machuca e incomoda como esse nó no meu cabelo que eu não consigo tirar. Dói no cabelo que já não fica o mesmo. Dói em mim que não consigo resolver o impasse. Permanece a dor de cabeça como brinde de um empate curioso dessa espera. É ruim quando a gente ama e se desespera porque o amor já não cabe mais na mesma caixa, no mesmo frasco. É estranho perceber que ele mudou de formato. Que o que antes se esparramava todo na imensidão bonita de seus laços, agora se desembrulha tímido pela fresta do desmaio. E é fato que já não é mais como era antes. Mas isso tem que ser pior? Se o que era antes acabou é porque não era tão bom assim. Ou assim eu gosto de tentar pensar. E me distraio com o cabelo que faz tempo que assim como esse amor já não é a mesma coisa a brilhar. Viço que tira férias. Brilho que desacostuma. E a vida passa a ser de repente uma festa de pontas duplas pra todos os lados. Quer colorir. Experimenta pôr de lado. Inventa um novo penteado, mas a estrutura do fio ainda é a mesma que teima em nascer de novo enrolado, enrolado, enrolado. Até fazer cacho. Ainda que suave. Só na ponta. Faz tempo que anda muito agressiva e tem certeza de que não é nenhuma progressiva que vai trazer resultado. Precisa é de tratamento. Banho de creme e de choque. Cuidar da raiz com cuidado. Benção de hidratação. Precisa é tentar proteger a alma desses efeitos nocivos de começo de verão.
Crônica do livro “As Maravilhas do País de Alice”, Scortecci Editora, São Paulo, 2008.
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