“Penso, logo existo”, concluiu o filósofo René Descartes. Na Era dos Espetáculos, o que vemos cada vez mais é a repetição de comportamentos, o não pensamento, logo a não existência de cada um. Voltemos a pensar através desta viagem sobre a realidade… A Era dos Espetáculos.
Somos menos importantes para o mundo do que pensamos. Somos mais importantes para nós mesmos do que percebemos.
Se Eric Hobsbawm nos presenteou com a Era dos Extremos, a Era do Capital, a Era dos Impérios ou a Era das Revoluções, o mundo nos presenteia hoje com a Era dos Espetáculos. O que antes era feito com cuidado e atenção antes de ser apresentado ao público, hoje fazemos em segundos em nossos perfis pessoais.
Apenas o que havia muita preparação, muito suor e ensaio merecia destaque, hoje, qualquer coisa se tornou banal e pública. A autopromoção fala mais alto. O pior é que nem temos público para todo esse ego. A busca por reconhecimento e elogio, a necessidade de pertencer a um grupo fala mais alto. Quando foi que nos tornamos tão vulneráveis à aceitação alheia? Quando foi que deixamos de focar em nossas vidas particulares para observar a vida de outras pessoas? Quando foi que passamos a querer compartilhar nossas vidas? Quando foi que perdemos a noção do que é privacidade e porquê ela existe?
Na verdade, poucos vão se importar com o que você comeu hoje, se foi ou não à academia, se leva uma vida difícil ou não. Alguns amigos próximos podem até participar de postagens como essas, claro, mas o lado ruim disso tudo é que portas são abertas para que outros opinem sobre sua vida sem que você nem possa se defender e o pior é que você escolheu isso ao compartilhar o que pensa. Quando opiniões boas chegam, ótimo. O objetivo em se tornar capa de revista está no caminho certo, mas se são opiniões negativas, o caminho que está certo aqui é o da depressão. Sejamos francos.
Que tal apresentarmos ao público somente aquilo que criamos? Aquilo com que trabalhamos? Boas reflexões? Que tal um bom preparo antes de nos apresentarmos de graça ao mundo? Um pouco mais de critério? Que tal o foco ser a realidade e não uma fantasia virtual?
Muitos já devem estar cansados de críticas sobre o comportamento humano diante dessas tantas tecnologias que nos cercam e muitos devem se questionar o por quê disso tudo, por quê tanto “bafafá” sobre isso? “Lá vem outra crítica pessimista chata…” Chata sim, mas inútil não.
A resposta é a seguinte: responda quantas horas do seu dia, você dedica à socialização virtual e quantas horas do seu dia, se dedica a si mesmo? Aos seus projetos pessoais, aos seus desejos individuais? Quantas vezes já se questionou sobre sua personalidade? Se por um lado, ficamos mais informados do que se estivéssemos ausentes a tudo isso, por outro, deixamos nossas vidas amarradas a dar sempre uma “olhadinha” no telefone. Um telefone sem internet se compara a um ser morto. Dá angústia e ansiedade. A que ponto chegamos? Lembra que o telefone era feito apenas para telefonar e deixar recados?
O objetivo aqui é trazer o pensamento para a realidade. Enquanto passamos 40 minutos de cada manhã olhando o que aconteceu durante a noite com nossos perfis sociais ou nossas conversas em grupo, poderíamos ter saído, feito meia hora de caminhada e já estar tomando banho para sair de casa. Ou quem sabe lavar aquela louça que sobrou de ontem e que se não for lavada agora pela manhã, provavelmente vai ficar na pia a semana toda? Enquanto passamos horas à noite lendo sobre a vida de outras pessoas, deixamos de produzir conhecimento, deixamos de ler, estudar, cuidar de nós mesmos, arrumar um pouco nossas bagunças, ou simplesmente, dar atenção aos nossos pais, filhos e irmãos. Quantas famílias não estão se distanciando em cômodos atualmente?
Existe muito com o que nos preocuparmos sobre essa Era dos Espetáculos. Existe sim motivos para tanto “bafafá”.
Existem pessoas se tornando depressivas ao viver se comparando com outras, existem pessoas com um super ego, existem pessoas se tornando arrogantes de graça em comentários de colegas apenas por se sentirem os donos da verdade ou apenas para serem os últimos a falar, existem filhos crescendo e pais não vendo, existem pais envelhecendo e filhos não vendo, existem casais sentados um ao lado do outro e se sentindo sozinhos, existem pessoas que deixam de cuidar de si mesmas para ficar olhando o que acontece na vida dos outros, existem pessoas que não fazem um prato de almoço por preguiça enquanto ficam o dia inteiro em redes sociais, aliás, também há quem não faça nada, nada mesmo! para ficar em frente ao computador, existem aqueles que não trabalham direito, que deixam detalhes importantes passarem por despercebidos porque estavam olhando o celular, existem aqueles que não dormem direito por isso, aqueles que deixam de estudar para as provas, aqueles que deixam de pensar em futuro para viver o fácil presente de não ter que pensar, aqueles que vivem dentro de uma fantasia sobre si mesmos e não encaram a realidade, aqueles que forçam uma personalidade que não possuem apenas para serem bem aceitos, aqueles que deixam tudo para depois e aqueles que estão por trás, rindo disso tudo, de como é fácil manipular o comportamento e a opinião humana.
Seres humanos são seres sociáveis e por isso, facilmente imitam comportamentos. Natural, mas sejamos seres mais autocríticos. Saibamos nos dar nossos devidos limites. Sejamos adultos e sejamos, por favor, responsáveis com nossas vidas e a vida dos outros. Saibam que trabalhar conectado com outros assuntos que não sejam trabalho naquele momento, pode ser crucial para causar um problema na vida de terceiros. Saibamos nos dar o devido tempo de brincar como adultos. As redes sociais são nossas brincadeiras nos tempos modernos. São os joguinhos na fase adulta. São nossos portais para o desligamento do mundo real, o mesmo propósito das brincadeiras tão divertidas nas nossas infâncias. É claro que existe o lado bom disso tudo, estamos conectados, estamos próximos de amigos distantes, estamos por dentro de diversos tipos de pensamentos sobre determinados assuntos, podemos rir junto de pessoas que não vemos há anos… Vamos brindar essa diversão!
Mas saibamos utilizar as tecnologias em momentos certos, por tempos limitados e não, o dia inteiro, a noite inteira ou até mesmo deixar isso se tornar uma obsessão. Saibamos o que devemos compartilhar ou não com tantos amigos virtuais, que na verdade, nem são tão amigos assim na realidade. Pensemos sobre o que queremos que saibam de nossas vidas… Tornemo-nos menos presentes, façamos falta. Sejamos mais peculiares e atraentes. Tenhamos nosso mistério, nosso silêncio. É igual roupa, se mostrar tudo, perde a graça.
Um brinde aqui, não ao individualismo ou ao egoísmo, mas ao amor próprio, amor esse que não tem necessidade de exposição nem da atenção alheia.
Um brinde àqueles que conseguem se focar na realidade de suas vidas e que não se abatem ao ver a felicidade alheia exposta na rede, pois sabem que suas felicidades dependem de si mesmos e não dos outros. Sabem também que não precisam criar momentos felizes apenas para conseguir uma foto boa o suficiente para colocar na rede. Inclusive, se esquecem de tirar foto quando o momento foi tão especial, que nem havia tempo para lembrar de uma câmera.
Um brinde àqueles que refletem antes de dizer.
Àqueles que lutam por seus objetivos e que percebem como é precioso esse excesso de tempo desperdiçado em redes sociais e grupos de conversa.
Um brinde àqueles que conseguem viver suas vidas sem a necessidade de criar um Espetáculo para qualquer acontecimento banal cotidiano, neste caso, o espetáculo é de marionetes. Um brinde àqueles que possuem algo realmente espetacular para apresentar. São estes os que sonham e que vivem por si sós, independente do que o mundo aprove, pense ou diga. Um brinde à liberdade, aos abraços e à vida real.
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