Lá vem ele. Vem reduzindo a marcha, sinalizando, aproximando-se, abrindo a porta, esperando você entrar. Mas você olha e pensa: será? Tá muito cheio, tá muito vazio, tá muito cedo. Então decide esperar o próximo e o vê partir sem você. Acontece. Como também acontece de o próximo não chegar tão cedo, de chegar mais cheio que o outro, de ser muito tarde. Aí você perde a hora e pensa: “puxa, vida! Eu devia ter embarcado no primeiro ônibus”.
Guardadas todas as proporções, a maior diferença entre os ônibus e o amor é: ainda que demore, o próximo ônibus sempre vem. O amor, ninguém sabe. Esse negócio de esperar “a hora certa” para sentir amor, sei não.
Tem tanta gente esperando no ponto! Debaixo de chuva ou ardendo no sol, tremendo no frio ou suando calor, de dia ou de noite, tem sempre uma multidão apinhada, à espera. É sempre hora do rush. O ônibus não tem lugar pra todo mundo. Já o amor, ahh… no amor cabe o mundo todo.
O ônibus segue um itinerário padrão, passa pelas mesmas ruas, dobra as mesmas esquinas. O amor toma seu próprio rumo.
Quem vai de ônibus depende da boa vontade do motorista. Quem embarca no sentimento amoroso dispensa até a companhia se assim quiser. A gente pode amar sozinho mesmo. Se vier alguém, que embarque conosco porque o espaço é amplo, o coração é generoso e o caminho é livre.
Amar é coisa que a gente se permite, sabe? A gente sente ou não sente. Embarca de uma vez, não fica aguardando no ponto. E se não der certo a gente desce, ué!
Se o amor, em seu rumo próprio, enveredar por caminhos estranhos e rotas indesejadas, se ele correr demais ou se arrastar feito lesma, se não soubermos mais para onde estamos indo, é só saltar. A gente salta, sozinha ou acompanhada, e segue para onde sentir o coração apontando.
Sentir amor reside em nós. Depende de ninguém mais. Por nós mesmos ou pelo outro, a gente embarca quando ele chega. Não espera o próximo, não. Porque pode ser que o próximo não venha. Ninguém sabe. Mas ninguém prova o contrário. Lá vem ele. Vai embarcar ou vai esperar?
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