“Teus filhos não são teus filhos. São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.” (Khalil Gibran)
Quanto mais tentamos controlar as pessoas, mais elas nos fogem por entre os dedos. Cada um de nós tem a necessidade de procurar nosso lugar no mundo, de acordo com o que somos e pensamos – é a nossa verdade, que pulsa por afirmação e ar puro. Nada nem ninguém conseguem nos prender, nesse sentido, por muito tempo, pois nascemos para sermos únicos, para sermos nós mesmos.
Quando se trata de filhos, porém, torna-se muito difícil, principalmente às mães, acompanhar de longe, na torcida somente, o autodescobrimento e a formação de identidade daquelas que são as pessoas mais importantes e amadas em suas vidas. Instintivamente, as mães necessitam proteger os seus filhos de qualquer ferida, pois sempre parecem doer muito mais nelas mesmas os machucados dos seus rebentos. Com isso, fugindo à sua função de orientar, aconselhar e apoiar, acabam muitas vezes impondo aos filhos aquilo que elas esperam que eles sejam, sintam, falem e façam, até mesmo a quem devem se entregar, numa via de mão única, em que o diálogo não encontra espaço. Obviamente – e felizmente -, os filhos, mesmo que demore, irão se tornar aquilo que eles tinham de ser; irão agir da forma como eles quiserem, obedecendo aos desejos que são só deles; irão sentir de acordo com que eles possuem dentro de si; irão namorar a pessoa por quem eles se apaixonarem, a despeito da aprovação ou desaprovação dos pais.
Nesses momentos, cabe aos responsáveis o aconselhamento, o diálogo e a exposição saudável de pontos de vista, sem agressividade ou cobranças de quaisquer tipos – quanto mais baixo falamos, mais o outro nos escuta; simples assim. Os pais precisam aprender a assistir aos filhos na caminhada que lhes é destinada, deixando-os sofrer, cair, decepcionar-se, machucar-se, por mais que isso seja dolorido, pois somente assim eles aprenderão as lições de vida e serão levados a repensar, a recomeçar, valorizando e utilizando tudo o que lhes foi ensinado, desde pequeninos. Nos momentos de dor, principalmente, e na hora certa, os filhos encontrarão apoio nos valores que adquiriram no seio de suas famílias e isso os ajudará a reerguerem o ânimo em meio às tragédias pessoais a que estão sujeitos.
Por essa razão, precisamos preencher as nossas vidas urgentemente, caso estejamos por demais incomodados com a vida do outro, pois ninguém tem o direito de impedir o caminhar e o existir alheios, nem dos filhos nem de ninguém. Excepcionalmente, quando eles estiverem adentrando por caminhos tortuosos e destruidores – como o das drogas, da violência, do crime -, a intervenção direta dos pais e responsáveis será, sim, necessária e bem vinda; caso contrário, os filhos precisam apaixonar-se pela pessoa errada, escolher o caminho mais difícil, gastar dinheiro inutilmente, enforcar aula, decepcionar-se com as pessoas, para que venham a colher amargamente as consequências e com isso aprender a ser gente melhor. Temos que, muitas vezes, deixar a vida ensiná-los, pois ela é mais dura e incisiva do que qualquer um de nós, e todos precisamos dos tombos abruptos para nos tornarmos cada vez melhores e mais fortes.
Ter essa consciência de que os filhos devem viver à revelia dos nossos desejos e sonhos é primordial inclusive para que enfrentemos com menos pesar a síndrome do ninho vazio, como a chamam os psicólogos, quando os filhos partem com suas malas, sonhos e ilusões rumo à faculdade, ao intercâmbio, ao casamento, à vida longe dos pais. Por mais aflitivo que seja, distanciar-se e deixá-los confortáveis nessa nova etapa de vida é o melhor a se fazer. Eles crescem, sabia? Crescem e devem aprender, por seus próprios meios – pois já carregam dentro de si, nesse momento, tudo o que achamos que eles não ouviram de nós -, a economizar para não faltar, a se dedicar aos estudos para não bombar, a respeitar para ser respeitado, a conquistar bens e dignidade no casamento, a ser solidário e humano. Interferir sem ser chamado é tolher do filho o potencial de vida e a construção de destinos que são só dele.
Assim como plantamos as sementes e observamos o fruto crescer e florescer, com podas ocasionais e água para aliviar-lhes o sufoco, devemos nos deslumbrar e nos orgulhar enquanto assistimos ao desabrochar de nossos filhos, aliviando-lhes a lida e estendendo-lhes as mãos, quando e se precisarem. Aprisionar as plantas não as fará desistir de procurar pela luz do sol; da mesma forma, controlar e sufocar os filhos não os fará desistir de lutarem por suas verdades, pela realização dos seus sonhos e concretização de seus desejos – deles e não dos pais. Afinal, eles precisam aprender a discernir o que lhes faz bem e o que não, enquanto experimentam as coisas, as pessoas, o mundo, pois é essa vivência prática que dignifica e amadurece as pessoas, e nenhum sermão substitui isso. No mais, caso a vida se torne dura, triste e insuportavelmente pesada, será sempre um alento saber que existe um pai, uma mãe e um lar para onde podemos regressar, mesmo que somente em nossas lembranças, um lugar a que pertencemos, onde encontraremos conforto consolador, bem como força para recomeçar, sempre e incansavelmente.
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