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A paixão (entre o real e o virtual): platonismos a parte, o que estamos fazendo de nossas vidas?

Por Guilherme Ramos – via Obvious

Enquanto uma porção de pessoas cabisbaixas – de olho em seus celulares – perambula por aí, entre a wi-fi e a 4G, eu e você podíamos nos conhecer. Off-line mesmo. Não importa se usamos tablets, smartphones, notebooks, desktops ou algum outro equipamento novo no mercado. Encontrar-se é o desafio. De uma forma inusitada e sem maiores porquês. Está escrito. Em algum blog, site, rede social ou nas estrelas. Não sei ao certo. Quem sabe? Quem se importa? Eu quero apenas me apresentar. Com um singelo aperto de mão e abraçar você. Não precisamos de Apps para isso. Não precisamos de antivírus. Talvez, preservativos. Somos mais do que arquivos anexados num e-mail. E bem mais do que #hashtags genéricas. Somos humanos. E, como tal, somos seres sociais.

Há uma tendência natural dos usuários de smartphones usarem-nos para facilitar suas vidas, inclusive, encontrar um par ideal. Encontramos diversos serviços on-line e gratuitos – até certo ponto – que vem ajudando a turma na paquera. Ah! Não é seu caso? Interessante. Mas olhe ao redor. Quantos, em sua roda de amigos, fazem isso? Quantos passam mais tempo na Internet que olhando ao redor? Quanto, de sua humanidade, a tecnologia vem flertando?

Alguém já ouviu falar em “amor platônico”? Quando amamos alguém de forma tão idealizada, impossível de acontecer? Pois é! A meu ver, esse sentimento foi uma inspiração para as atuais redes de encontros pela Internet. Platão (427-347 a.C.), criador dessa linha de pensamento, acreditava que tudo – absolutamente tudo – no mundo era uma cópia de algo melhor que existia no “Mundo das Idéias”. Lá, sim, a beleza era mais bela e as pessoas… perfeitas. Mas ele, coitado, sequer imaginava o que as pessoas fariam com seus ensinamentos.

Olha para as redes sociais, os Apps de encontros, entre outras bugigangas amorosas e reflita: lá, tudo não se faz tão perfeito? Até você se torna perfeito aos olhos dos outros. O motivo? Cativar seguidores e servir-se de amor. Virtual. Às vezes, um pouco de sexo. Virtual. Quando o coração já anda mais pra lá do que pra cá, mas é o que se tem. E, assim, vivemos entre logins e logouts constantes, em busca de alguém. Que quase nunca chega. Lembra alguma coisa? Pois é, isso tem nome: platonismo. De certa forma, um novo platonismo, que recebeu um upgrade e atinge mais e mais seguidores por todo o mundo.

Clique aqui, clique ali, vamos nos conhecendo melhor. Virtualmente. Vemos fotos, vídeos, trocamos palavras em chats, damos presentes – também virtuais – um ao outro, recebemos premiações por sermos sociáveis, bonitos, paquerados, seletivos… E, contato que é bom, nem pensar. Buscamos outro aplicativo. Dependendo da distância, estamos aptos a nos encontrar. Batemos mais papos on-line, trocamos alguns e-mails, expomos nossa intimidade… E nada de encontro.

Arriscamos locais mais ousados. Fotos picantes. Desejos intensos. Fotos e mais fotos do que queremos ser. Momentos. Para nosso bel-prazer. Expostos. Como carne e frango no açougue mais próximo. E, até lá, a carne é mais aceita por nós que nós mesmos.

Bate uma depressão, né? Nem tanto. Prefiro uma reflexão. O que estamos fazendo de nós mesmos? Damos mais valor ao virtual que ao real? Será que nossa vida é tão cruel assim, que não podemos nos relacionar analogicamente? Precisa passar pelo crivo da internet? Não, não creio nisso. Acho ineficaz e mesquinho. Uma pena, até. Porque o melhor da vida, gente, é arriscar – tudo ou nada – vez por outra. Por que ter medo do que o outro vai dizer? Do que o outro vai achar? Se o outro vai curtir? Se o outro não vai compartilhar? Somos o que somos. Não somos o que restamos. O mundo é virtual demais para nossa realidade. Precisamos fazer alguma coisa.

Que tal – e é apenas uma opinião – não usamos a tecnologia para nos aproximar das pessoas e, após certo tempo (breve, por favor), não nos tornamos reais em suas vidas? Falo isso como usuário do mIRC (é, faz um tempinho. Se não sabe o que é, dá uma pesquisada no Google…), já me apaixonei por um punhado de pixels e emoticons. Conheci alguém de dentro para fora. Peguei um ônibus e fui ao seu encontro. Namoramos. Amamos até o amor secar como um solo fértil, que já deu o que tinha que dar. Aí seguimos, cada um para seu lado, com as lembranças que nos restaram e nos permitimos. Valeu. Foi real. Mas acabou.

E aqueles que nunca começam? Ficam no tal platonismo, infrutífero, cercado de receios por todos os lados? Abafando o amor que carregam em seus corpos, em prol de uma ilusão virtual que nunca irá saciar suas sedes? Tantas dúvidas e medos fazem parte do ser humano. Mas somos mais do que isso. Podemos ir além de meras curtições e compartilhamentos. Mas precisamos passar por isso, para saber do que somos capazes.

Certa vez, num restaurante conhecido por receber pessoas que se conheceram pela Internet, eu vi um casal. Lindos. Coisa de cinema. Assim como a cena: um chegou antes, esperou e esperou e esperou. Estava tenso. Como em qualquer primeiro encontro. Até que a outra pessoa chegou. Meio tímidos, cumprimentaram-se. Sentaram-se. Fizeram seus pedidos. Enquanto esperavam, acessaram um sem número de redes sociais e Apps. Fotografaram suas refeições, jantaram, tiraram selfies e foram embora. Quase não trocaram palavras. Eu e meu cappuccino assistimos a tudo. Acompanhei-os com o olhar e, pela janela, vi cada um seguir seu caminho, sem nem olhar para trás – tinham olhos apenas para seus smartphones.

Imediatamente, peguei meu celular, liguei para alguns amigos e disse onde estava. Que precisava deles. Que era sério. Em pouco tempo eles chegaram. Concordamos em deixar os telefones silenciosos sobre a mesa para curtir a noite à moda antiga. Conversamos. Rimos. Vivemos momentos incríveis. Tão incríveis, que esquecemos até de tirar fotos. De registrar o encontro. Mas voltamos para nossas casas felizes. O que devia ser guardado, estava em nossas mentes e corações.

Faça o mesmo. Dê um tempo no mundo virtual. Chame aquela pessoa “especial” para sair. Viva-a. Viva-se. Porque nada, absolutamente nada, substitui o contato. E não, não me refiro a esse monte de nomes e números que compõem a agenda do seu celular. Eu falo de contato humano. Mão a mão, corpo a corpo, olho no olho. Vivendo cada vão momento como se fosse o último. Porque, a qualquer momento, pode ser.

A Soma de Todos Afetos

Blog oficial da escritora Fabíola Simões que, em 2015, publicou seu primeiro livro: "A Soma de todos Afetos".

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