Crescendo, percebi que o que mais me atraia nas pessoas era a maneira como elas sorriam. Passei a dividir o mundo entre pessoas que sorriem ou não com os olhos. Desconfiava de quem se resumia a mostrar-me os dentes. Tratando-se de afeição, carinho ou paixão, todo tipo de grandeza para mim definia-se nos desenhos emoldurados por cílios e sobrancelhas.
Quando era pequena e meu irmão nasceu, não demorou muito para eu perceber que tinha algo diferente nele. Sempre que ele sorria, mesmo não sabendo que sorria através das poucas habilidades cognitivas de um recém-nascido, ele franzia os olhinhos. Lembro que um dia, intrigada e curiosa como toda criança com uma novidade, perguntei para minha mãe se meu irmãozinho era japonês. A minha mãe gargalhou com a minha teoria, e me explicou que era o jeito dele sorrir. Que ele sorria com os olhos. “Como assim ‘sorri com os olhos’, mamãe, se a gente sorri com a boca?” instiguei-a. “Algumas pessoas sorriem com os olhos” ela explicou.
De fato meu irmão cresceu e nunca perdeu aquele jeito peculiar de sorrir. Cada vez que gargalhava ou ficava feliz, suas bolotas negras, antes grandes, se reduziam em forma de gotinhas. Era como se sorrir com a boca não bastasse. Não podia envolver apenas as linhas inferiores do rosto, queixo, lábios e dentes. Precisava contorcer também as janelas da alma. E ao modificar seus olhos, ele modificava os meus. Não tem como não se manter indiferente frente a alguém que sorri com os olhos.
Crescendo, percebi que o que mais me atraia nas pessoas era a maneira como elas sorriam. Passei a dividir o mundo entre pessoas que sorriem ou não com os olhos. Desconfiava de quem se resumia a mostrar-me os dentes. Tratando-se de afeição, carinho ou paixão, todo tipo de grandeza para mim definia-se nos desenhos emoldurados por cílios e sobrancelhas. Eu procurava as gotinhas sorridentes nos rostos conhecidos ou recém-chegados. Contava as linhas de expressão ao redor dos olhos, provas do tempo de que aquele alguém contabilizou sorrisos oculares. Admirava aquela musculatura exercitada pela alegria da vida. Tornei-me meio Machado de Assis, “gosto de olhos que sorriem, de gestos que se desculpam, de toques que sabem conversar e de silêncios que se declaram”. Mas veja, tudo começa nos olhos.
A coisa evoluiu de tal forma que hoje nada me desconcentra mais que um lindo par de olhos a sorrir. Falando de sedução, não existe miragem mais atraente que acordar do lado de alguém que te entrega o “bom dia” com os olhos. Podem ser remelentos. É como se a manhã se ressignificasse e sair da cama passasse a não fazer mais sentido. A capacidade de sorrir com os olhos, além do apelo visual, é também muito prática- ora, se não precisas da boca pra sorrir, porque não usá-la para beijar enquanto os olhos se comunicam? Eu caí poucas vezes em uma paixão à primeira vista. Todas foram tropeçando pra dentro destes redemoinhos que são os olhos sorridentes. Sugando-me para profundezas desconhecidas, enquanto entregava-me deliberadamente na vontade de me afogar. Olhos que sorriem são meu fraco, falam diretamente com minhas entranhas, enfraquecem minhas pernas e causam maremotos na parte mais sensata do meu cérebro. Para resistir um crush que sorri com os olhos, somente fechando os meus – não tem outro jeito.
Pessoas que gozam desta sensibilidade são mais bonitas, me arrisco a dizer. É como se a melhor parte delas não pudesse ser contida e transbordassem pelas pupilas. Tyra Banks chamou esse fenômeno de “smize” em American Next Top Model, dizendo que apenas as melhores modelos dominavam este know-how. Não acredito que algo tão lindo quanto especial possa ser resumido a uma palavra, ou deva ser usado simplesmente para conseguir o melhor click de um fotógrafo. Sorrir com os olhos vem de dentro. Tem propósitos mais dignos, como risadas com as amigas, uma conexão entre duas paixões, a realização de um sonho, o reconhecimento do amor fraternal no irmão recém-chegado. A gente não abre a alma para qualquer um ou qualquer coisa. Essas janelas especiais tem manha. E olhar pra dentro delas, não é apenas um prazer, é um privilégio. Então da próxima vez que você estiver frente a alguém que sorri com os olhos, pare. Observe. Algo espetacular está prestes a acontecer.
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Não consigo aceitar Machado de Assis como autor do texto que você menciona. Não parece o estilo dele, não localizo em nenhuma publicação.