Categories: Marcel Camargo

Não se acostume com o que lhe faz mal

Não se acostume com a tirania alheia, com a não existência, com a nulidade, com a invisibilidade perante o mundo. Seja você mesmo, ou assista à felicidade esvair-se por entre as escuridões de seus próprios medos.

Para que possamos nos equilibrar emocionalmente e conseguir segurar as pontas das atribulações diárias que consomem o nosso caminhar, muitas vezes teremos que aceitar resignadamente certas coisas que não podemos mudar, ou então nos perderemos em meio a sucessivas frustrações. Mesmo assim, deveremos sempre estar atentos para que não nos acomodemos e aceitemos os excessos alheios, a ponto de anularmos nossa dignidade e permanecermos feridos e enfraquecidos.

Não se acostume com a tirania alheia, com a imposição de verdades que não são suas, com a neutralidade frente ao incômodo. Temos que nos impor como pessoas que possuem algo a oferecer, pois somos merecedores de conquistar nosso lugar no mundo, de alcançar a felicidade a partir daquilo em que acreditamos. Não podemos engolir pontos de vista que não são nossos, apenas para evitar conflitos e apaziguar o ambiente externo enquanto nosso íntimo é açoitado injustamente.

Não se acostume à intolerância do outro para com seus pensamentos e atitudes. Não aceite não ser respeitado pelo que você vive, pela transparência com que caminha sobre os percalços que são só seus. Ninguém tem o direito de ridicularizar ou menosprezar as suas crenças, as suas vivências, os seus sentimentos. Você é especial e único em sua essência e nada poderá deter a extensão de seus sonhos, a menos que você permita.

Não se acostume ao mendigar por atenção, por carinho, por amor, por qualquer coisa que seja, pois somos todos merecedores de receber sentimentos de forma voluntária e sincera, nada menos do que isso. Esqueça o medo de perder alguém, o medo de não ser amado, de não ser querido. Você tem muito dentro de si para atrair olhares, sorrisos, abraços, sem precisar implorar ou se sujeitar à subserviência que lhe apaga as faíscas de humanidade que borbulham em seus poros.

Não se acostume com as pessoas que já estão ao seu lado, a ponto de se esquecer de cativá-las continuamente, acomodando-se com o que já parece consolidado. Qualquer tipo de relacionamento necessita de atenção e de responsabilidade emocional, ou seja, temos um compromisso com quem nos admira e torce pela nossa felicidade. Não podemos achar que o amor sobreviverá do que já aconteceu, do que o trouxe até nós. Caso negligenciemos os sentimentos alheios, o amor partirá em busca de outras moradas.

Não se acostume com a não existência, com a nulidade, com a invisibilidade perante o mundo. É preciso que sejamos alguém perceptível, alguém admirável, confiável, alguém que seja visto, em casa, no trabalho, na rua, na escola. Não conseguiremos suportar uma vida muda, atuando como coadjuvantes da trama do destino que se descortina diariamente diante de nós. Precisamos falar o que pensamos, lutar pelo que queremos, reclamar contra o que nos incomoda, ou ruiremos por dentro, longe de tudo o que pode nos tornar melhores e mais felizes.

Não se acostume com a corrupção, com a violência, com a miséria social. Não perca a capacidade de indignar-se contra tudo o que avilta o bem estar da sociedade como um todo, contra as injustiças que acometem os desvalidos, por conta de dogmas insustentáveis e/ou preconceitos ilógicos. Não deixe de lutar com paixão em favor dos seus sonhos, atrelando-os sempre ao bem estar do coletivo do qual faz parte e é peça imprescindível. Não se acostume a ser uma ilha isolada, mas integre-se ao todo, sem egoísmo, sem covardia, sem titubear.

Muito do que nos acontecerá independerá de nossas ações e desejos, porém, jamais poderemos nos furtar de evitar que nos tratem com desrespeito, desprezo ou violência. Nascemos para sermos felizes, para buscar a realização de nossos sonhos junto a pessoas que dissiparão nossos medos e acalentarão nossas necessidades íntimas e pessoais. Perder-se dentro de si por temor ao enfrentamento de conflitos parecerá cômodo, num primeiro momento, mas fatalmente nos distanciará de nossa essência, de nossa humanidade, de nosso bem estar. Seja, portanto, você mesmo, ou assista à felicidade esvair-se por entre as escuridões de seus próprios medos.

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar".

View Comments

  • Muito bom! Já experimentei na pele algumas situações em que resolvi calar o que eu sentia para evitar conflitos e quem ficou doente fui eu!Precisei ir na Psicóloga.Mas agora estou bem,recuperei minha auto estima,sentia como se tinha perdido minha essência, o meu "eu".

Share
Published by
Marcel Camargo

Recent Posts

Esse filme de romance da Netflix é a dose leve e reconfortante que seu fim de ano precisa

Se você é fã de histórias apaixonantes e da fórmula que consagrou Nicholas Sparks como…

1 dia ago

Na Netflix: Romance mais comentado de 2024 conquista corações com delicadeza e originalidade

Se você está à procura de um filme que mistura sensibilidade, poesia e uma boa…

3 dias ago

Pessoas que foram mimadas na infância: as 7 características mais comuns na vida adulta

Uma infância marcada por mimos excessivos pode deixar marcas duradouras na personalidade de um adulto.…

5 dias ago

“Gênios”: Saiba quais são as 4 manias que revelam as pessoas com altas habilidades

Alguns hábitos podem parecer apenas peculiaridades do cotidiano, mas segundo estudos psicológicos e pesquisas científicas…

5 dias ago

As 3 idades em que o envelhecimento do cérebro se acelera, segundo a ciência

O envelhecimento é um processo inevitável, mas não linear. Recentemente, cientistas do Primeiro Hospital Afiliado…

1 semana ago

Desapegue: 10 coisas para retirar da sua casa antes de 31 de dezembro

Fim de ano é sinônimo de renovacão. Enquanto muitos fazem balanços pessoais, é também um…

1 semana ago