Era uma quarta-feira qualquer quando o moço sorriu torto pra mim e me disse que eu tinha que ser mais menina. Eu deveria ser menos militante, menos questionadora, menos eu. Talvez sentar de pernas cruzadas, retocar um batom cor de rosa, não falar palavrão, ser menos dramática. O último que me pediu calma e menos drama, eu disse não. Depois do primeiro “não”, você adquire seu direito de ser palavrão, de ser batom vermelho e de dramatizar o que quiser. Se cada pessoa que passar pela a minha vida, eu der o poder de decidir quem eu vou ser, eu não vou ser ninguém. Vou ser uma marginal da opinião alheia.
Faz muito pouco tempo que aprendi que talvez eu não precisasse de pedir tantos conselhos aos amigos. Talvez não precisasse expor tanto meus projetos e planos. Afinal, as pessoas, no geral, tendem a descredibilizar as ideias dos outros ou dar opinião gratuitamente. Depois do primeiro “não”, eu passei a ter certeza até dos erros que queria cometer. E a opinião amiga ou alheia foi se reduzindo até ocupar o espaço que de fato nunca deveria ter sido maior. As mulheres geralmente crescem sob a pressão de serem agradáveis, bonitas e simpáticas o tempo todo, tipo propaganda de creme dental. Muito sorriso e sedução. E assim, o famoso “ninguém vai querer namorar uma moça/mulher assim” nos ronda como uma dragão de três cabeças a vida inteira.
Mas acontece, moço, que eu sempre dei de ombros para regras. Meu sonho de consumo, quando era criança, nunca foi uma boneca, sempre quis um carrinho com controle remoto. E Nunca tive. Minhas pernas tem coleções de cicatrizes e peraltices. A minha vida é baseada em história pra viver e contar desde sempre. Venhamos e convenhamos, se eu fosse a menina que você esperou que eu fosse, talvez só tivesse novela na cabeça. Moço, a vida da gente também é feita de coisas que gostaríamos de ter, coisas que temos e coisas que não sabemos ter. Mulheres que não vivem dentro de uma propaganda de creme dental são aquelas não pedem favores para os bons costumes, nem fazem processo seletivo para serem aceitas. É muito mais bonito você admitir que não sou o tipo que você não sabe ter, do que me reduzir para acompanhar a tabela padrão.
Longe de ter certeza que meu estilo de vida é o ideal, eu subi em cima do dragão de três cabeças e acertei-o no peito. Subi sem saber se conseguiria, subi duvidando da minha capacidade de ser eu mesma sem a voz do bichano trovejando atrás das minhas decisões. Com algumas lesões e queimaduras, acertei-o. Acho que ainda escuto um zumbido do estrondo da queda. Foi então, em uma outra quarta-feira que eu descobri que paga-se um preço bem alto por matar dragões, e foi também quando tive a certeza que esse preço valia a pena.
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uoou.. mandoou bem dona maria.