Tenho pensado muito na importância da gente “se bastar”. De tornar momentos vazios companheiros perfeitos para nossas pequenas felicidades. Seria maravilhoso se todos nós nos sentíssemos plenos conosco, diariamente, em um “se bastar” muito maior que “beijinho no ombro” em fotos publicadas online, não é?
Estar completo e satisfeito, só ou acompanhado, tem muito a ver com o prazer que sentimos em estar em nossa companhia, em sermos respeitosos conosco e gratos pelas coisas boas que temos.
E nos deixarmos encantar, curtindo a sensação boa de estarmos coladinhos conosco, fala muito sobre o tamanho do nosso mundo interior.
Crianças têm um mundo interior absurdamente amplo. Conseguem achar graça em um rolo de papel toalha. Já adultos comumente não tem essa mesma facilidade para se encantar ou melhor para “se bastar”. Quase sempre é preciso que esteja acontecendo alguma coisa excepcional, passando algo muito interessante na televisão ou que aquela pessoa interessante esteja online para que a empolgação aconteça. Senão, o tédio aparece e a graça das coisas bate em retirada.
Se eu pudesse desejar algo para os que amo, desejaria que pudessem “se bastar” com bem pouco, pois quanto mais profundos somos, quanto mais nos conhecemos e nos gostamos, menos as coisas da vida real precisam estar nos habituais conformes para nos animarmos e nos darmos por satisfeitos com elas.
Uma criança ao ganhar um pedaço de bolo, um sem a tão almejada cereja, se delicia com ele mesmo assim e ao final ainda o esfrega feliz no rosto, no cabelo e na roupa.
Já um adulto, um que saiba buscar em seu espaço interior companhia e contentamento, pode até perceber a falta da cereja, mas não se importa em demasia, pois a falta da cereja não desmerece a massa do bolo, tão pouco desqualifica quem o preparou. Existem prazeres em outros cantos e não somente naquela cereja.
Por outro lado, se ofertamos o mesmo bolo para uma pessoa que esteja mergulhada até a ponta do cabelo na “razão das coisas”, certamente ela vai querer trocar o pedaço de bolo, vai reclamar com o gerente, vai pensar mal dos funcionários e terminará o dia com uma indescritível dor de cabeça. A falta da cereja nesse caso acabou com qualquer chance da pessoa em questão estar feliz e satisfeita consigo mesma.
Quantas vezes não cismamos em colocar o pingo em todos os is? Exigimos perfeição de um mundo imperfeito. Esquecemos que as coisas mais importantes são aquelas que não nos custam quase nada.
Que a gente não cobre desse mundo o que falta naquele universo mágico e particular que nos habita. Que a gente possa estar atento para não exigir do mundo real o que só um contato íntimo e amigável com nosso mundo interior pode nos dar.
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