Eu queria ser feliz e mal sabia que a tão urgente e excitante felicidade, em papel fotográfico colorido era um milagre, um nó que aguardava um expert para desatar. E o eterno gosto incômodo de buscar a aurora boreal como saída para a minha sobrevida me encurralava nas coisas mais comuns. A memorável, inesquecível e poderosa felicidade, existia apenas na casa ao lado, na próxima esquina, no botequim de sexta-feira. Era como buscar o centro do mundo no buraco mais frívolo do asfalto. Custou, mas entendi o direcionamento que a vida estava emoldurando, pelo menos para mim.
A felicidade não é aquele prêmio escroto cheia de improbabilidades, colocada bem no topo da prateleira, onde quase ninguém consegue alcançar.
De brava sofredora, passei a ser espiã dos minúsculos bocejos de alegria e enchi minha agenda com todas as badalações felizes. Suportei também o peso dos meus dias vazios, e por fim passei a comemorar minha vida, sem franzir a testa. Acabaram as frustrações. Felicidade era toda a situação libertadora que eu estava acostumada a viver e nem me dava conta disso.
É o leite quente logo cedo. O café que não entornou no fogo. O meu cãozinho lambendo meus pés, de pura alegria pela minha chegada. O meu chocolate predileto. Um dia de descanso depois do trânsito maluco. A comemoração do primeiro beijo. O tênis confortável. O perdão por um erro sem intenção. É visitar o passado borbulhante de boas lembranças e reler pilhas de bilhetes sem a dor da amargura. É saber cuidar do que ficou depois que ele se foi. Ser hospitaleiro quando os sentimentos baterem à porta. A felicidade pode ter uma forma imensa ou apenas o tamanho da palma da mão. Isso tanto faz, pois o resultado possui a mesma dimensão.
Felicidade assim é absolutamente imprescindível. Necessária e insubstituível. Faz parte da ala de sobrevivência, pois não projeta objetivos inalcançáveis. Felicidade necessária que eu, tu, ele e todos os outros necessitam.
Hoje, eu deito e rolo nas misturas simplificadas, pequenas e com um pouco de cor, incluindo as informalidades deliciosas que trazem a simples felicidade, tal como um cafezinho quente nos dias frios.
Felicidade é isso, aquilo e aquilo outro. É a verdade esquecida sobre mim mesma. Posso correr para todos os lados, sempre com a impressão de que se houver uma razão pequena que me arranque um alívio, um suspiro, um sorriso, convenço-me de que é a felicidade necessária.
Ela é divertida, transitória, passageira, rápida, para dar lugar à outra situação simples, comum, mas imperfeita e feliz.
Agora, conforme a demanda do momento, posso ficar feliz com um simples bom dia acompanhado de um sorriso iluminador ou com um abraço inesperado. Estar feliz minimiza o efeito da insegurança, da confusão afetiva e de outras tiranias. Esse sentimento de pertencimento à felicidade parece que nasceu junto com a minha impressão digital e entre as minhas prioridades, estar feliz é quase um código de conduta, uma senha obrigatória. É conferir de perto o arranjo feito entre o acorde e a partitura. Eu entendi isso, e agora aceito todos os imprevistos felizes. Aceito ter como hóspede, a tal felicidade necessária de cada dia, amém.
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