Bem naquela gaveta, toda bagunçada, cheia de quinquilharias encontrei uma fotografia nossa.
Sim, aquela foto.
Toda emaranhada em bijuterias, post-its e recibos de tempos atrás.
É aquela foto.
Daquele dia.
Do dia que em nada se parece com o dia de hoje.
Dia de urgência, não de pressa.
Por que fui abrir a gaveta?
Tão distraída e assoberbada, nem me lembro mais o que procurava.
Mas achei o que já nem me lembrava.
Nos achei.
Nós e aquele sorriso bobo.
Nós e aquele sorriso doído de tão rasgado.
Nós e aquela pontinha de lágrima escapando meio de lado.
Lágrima de doer de tanto sorriso bobo rasgado.
Esqueci a pressa, esqueci o que procurava, só não esqueci do que encontrava.
Do dia preso naquela fotografia.
Dia de de ser feliz por nada e por tudo ao mesmo tempo.
Voltei no tempo através do sorriso bobo escancarado num registro de segundos.
Segundos esses que nunca importaram.
Nem os que vinham antes, nem os que vinham depois daquela fotografia.
Ainda somos as pessoas daquela fotografia?
É só um pedaço de papel, perdido no fundo de uma gaveta.
Somos desse tempo em que fotografias ocupavam um pedaço de papel e o fundo de uma gaveta.
Sorte a nossa ser a fotografia do nosso sorriso bobo a estar perdida num fundo de gaveta.
O registro que não tinha pretensão de ser.
O sorriso que não tinha intenção de convencer .
Só de ser.
E o nós perpetuado num instante.
O nós que não se está mais.
Mas esteve, naquele dia, naquela foto, naquele momento.
Me sobrou o sorriso bobo, que permaneceu mesmo depois de fechar a gaveta.
Fotografias tem feitiço e ninguém nunca nem desconfiou.
Delas ou do nosso sorriso bobo?
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