De uns tempos pra cá, passei a sentir que as lágrimas de minha mãe têm desaguado com mais facilidade.

Seus olhos brilhantes, que por trás de sua armação de óculos para miopia não disfarçam as alegrias e dores vividas, hoje se emocionam mais demoradamente diante das singelezas da vida.

Mas minha mãe aprendeu a valorizar sua emoção. A guarda-la para o que realmente vale a pena. Aprendeu a resguardar o sal de sua sensibilidade para o que acrescenta.

E não à toa se comove com uma melodia que toca no rádio, lembrando os anos corridos e trazendo de volta o que não existe mais. Também se deixa desaguar em pingos d’água diante de um poema ou até mesmo um texto escrito por “sua menina”, a moça crescida que hoje sou.

Mãe é tempero. Mãe é cheiro de manteiga derretida na panela numa tarde fria e sabor de açúcar e canela sobre bolinhos fritos na cozinha.

Mãe é delicadeza e sensibilidade. Sabe chegar de mansinho e falar com doçura antes das oito da manhã, ou tratar de assuntos mais “salgados” com a propriedade de quem já enfrentou grandes marés.

Sabe ouvir nossas queixas e temperar com serenidade os percalços de uma vida.

Mãe já trilhou estradas tortuosas como as nossas e sobreviveu, sabe que a gente aguenta um pouco de pimenta forte, mas está ao nosso lado para aliviar o sabor picante com um copo d’água gelado.

Mãe é alho e sal no refogado nosso de cada dia. É sabor, colo, cheiro e calor, temperos do amor, sem tirar nem pôr.

Mãe se emociona fácil, principalmente quando está diante da vida do filho.

Mãe se comove com filho pequeno na festa da escola; se entristece com fossa de adolescente; se enche de orgulho na formatura. Mãe se sente uma rainha quando o filho se casa e se emociona absurdamente quando o filho se torna pai (ou mãe).

Mãe é conselho sobre o que fazer com a febre do menino; mãe é lembrança de noites em claro ao lado da cama. Mãe é repetição. Repetimos o amor que recebemos e até as broncas que doeram.

Mãe é erva doce no bolo de fubá com café quentinho e panela no fogo estourando milho de pipoca antes do filme começar.

Mãe custa a entender que os filhos crescem. Os filhos insistem em fazer a mãe perceber que essa bagagem agora é só deles.

Mãe quer continuar lembrando o filho crescido a levar o casaco nos dias frios e exige que ele raspe o prato até o fim.

O filho obedece a mãe, não porque ainda precise de limites, mas porque, lá no fundo, ainda precisa dela.

 Pois a vida é feijão com arroz. E mãe é sal, pimenta e alho no tempero dos dias… 

 

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*Imagem: “Mãe e filho”, Gustav Klimt, 1905

Fabíola Simões

Fabíola Simões é dentista, mãe, influenciadora digital, youtuber e escritora – não necessariamente nessa ordem. Tem 4 livros publicados; um canal no Youtube onde dá dicas de filmes, séries e livros; e esse site, onde, juntamente com outros colunistas, publica textos semanalmente. Casada e mãe de um adolescente, trabalha há mais de 20 anos como Endodontista num Centro de Saúde em Campinas e, nas horas vagas, gosta de maratonar séries (Sex and the City, Gilmore Girls e The Office estão entre suas preferidas); beber vinho tinto; ler um bom livro e estar entre as pessoas que ama.

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