No decorrer da vida, muitas mulheres cruzaram meu caminho. Minha mãe, minhas tias, avós, madrinhas, professoras, amigas, primas, colegas de trabalho e funcionárias. Magras, cheinhas, de cabelo tingido ou não, pele clara, pele negra, mestiças, altas, baixas, agitadas, calmas, revolucionárias, pacíficas, confiantes, desconfiadas… todas elas, sem exceção, deixaram sua marca, algo novo que me desafiou a querer me tornar o melhor tipo de mulher que eu pudesse ser.

Tive muita sorte. Lembrar minha infância é ter de volta as histórias contadas após a oração da noite, com minha mãe fazendo de nossa cama um ninho onde ela acolhia seus pequenos com paciência e amorosidade. Naqueles instantes, eu tinha um lampejo da mulher por trás da mãe, uma mulher que trabalhava fora, dirigia seu carro popular pelas ruas de paralelepípedos da cidade, ia ao banco e ficava horas na fila, administrava nossa casa, cuidava do meu pai e tinha fôlego para correr atrás da gente com um pano na cabeça fingindo ser a bruxa do rio. De vez em quando também aparecia com um permanente novo, estragando seus lindos cabelos lisos, mas dizia que “era moda” e a gente ria querendo discordar.

Depois vieram as avós, tias, professoras, primas, e uma infinidade de amigas. Aos poucos ia percebendo que desempenhavam papéis demais, acumulavam inúmeras funções, equilibravam mil pratos nas mãos, pés e cabeça. Mas por trás de toda aquela parafernália, algo brilhava. Algo que podia ser distinguido no meio de uma conversa, entre um café e outro, nas conversas através dos muros entre nossa ajudante e as vizinhas, nos papos de minha mãe ao telefone, nas salas de aula, nas brincadeiras de rua. Onde havia uma mulher, havia uma força não explícita, mas ainda assim, uma força poderosa, capaz de transpor muros e mundos por amor aos seus.

Mas o que faz uma mulher ser especial?

Uma mulher especial sabe que o mundo está longe de ser ideal, mas se encarrega de dizer “vai dar tudo certo” e arregaça as mangas para fazer o que lhe cabe pro dia terminar bem.

Uma mulher especial entende que não é possível abraçar todas as causas, mas nem por isso deixa de fazer sua parte. Ama, luta, ora e dá o seu melhor por aquilo que tem fé.

Uma mulher especial olha para o espelho e aceita suas imperfeições com bom humor, confiante de que pode driblar o tempo com muita bossa e borogodó.

Uma mulher especial se presenteia de vez em quando. Corta o cabelo, faz depilação, pinta as unhas de vermelho, experimenta uma roupa nova, lê um livro bom. Aprendeu, com a maturidade, que não precisa dar conta de tudo se primeiro não ser conta dela. Faz exames, papanicolau e mamografia, toma um bom vinho e assiste a um filme novo no cinema.

Mulheres especiais usam salto alto, anabelas, sapatilhas, chinelos de dedo ou simplesmente andam descalças, certas de que não é o calçado que faz seus passos firmes, e sim a vontade de resistir, dia após dia, pé ante pé.

Uma mulher especial sabe que a vida é muito curta para ser levada à sério, e por isso releva pequenos dramas diários cantarolando uma música nova enquanto enfrenta o trânsito da cidade ou passa roupas na varanda.

Mulheres especiais estão nas firmas, consultórios, empresas, comércio, hospitais, escolas e dentro de casa. São especialistas, aposentadas, patroas e empregadas. Sonham com a carreira, com mais tempo ao lado dos filhos, com a viagem para rever os netos e o pagamento no fim do mês. Comemoram vitórias, aumento de salário, carreira deslanchando, novas parcerias, um rebento a caminho. Sofrem com baixa remuneração, desvalorização, sobrecarga em jornadas triplas, filas nos hospitais, ônibus lotado, falta daqueles que ama. Trabalham, estudam, namoram, engravidam, choram, vibram, suam, tentam, resistem, vencem.

Uma mulher especial pode ser sua avó, sua mãe, sua irmã, sua tia. Pode trabalhar na sua casa, ao seu lado na empresa, ser sua chefe ou subordinada. Pode pegar o ônibus com você, estacionar o carro diante do seu na academia, ser a moça que pega o elevador e olha para o espelho encabulada todas as manhãs. Elas estão em todo lugar, num sorriso tímido na padaria ou num banco de jardim. Na igreja, no shopping, na estrada ou num café. Carregam consigo suas dores, alegrias, sonhos e desistências. Sabem que caminho seguir, mas nem sempre trilham a estrada correta. Tropeçam, caem, levantam e recomeçam. Amam, querem bem, se descabelam e se desesperam. Mas acima de tudo, acreditam na força que carregam. Uma força que desperta nos momentos mais decisivos, e que permite que sejam, simplesmente, mulheres especiais…

Fabíola Simões

Fabíola Simões é dentista, mãe, influenciadora digital, youtuber e escritora – não necessariamente nessa ordem. Tem 4 livros publicados; um canal no Youtube onde dá dicas de filmes, séries e livros; e esse site, onde, juntamente com outros colunistas, publica textos semanalmente. Casada e mãe de um adolescente, trabalha há mais de 20 anos como Endodontista num Centro de Saúde em Campinas e, nas horas vagas, gosta de maratonar séries (Sex and the City, Gilmore Girls e The Office estão entre suas preferidas); beber vinho tinto; ler um bom livro e estar entre as pessoas que ama.

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