Nossa grandeza e nossa pequeneza

Nesse período de férias escolares contei com a ajuda de minha mãe. À tarde ela ia para minha casa e lá ficava com meu filho e meu sobrinho, netos que ela sempre quer por perto. Outro dia, voltando do trabalho e encontrando-a em casa, tive vontade de deitar no seu colo e voltar a ser a filha que um dia eu fui. Mas o que eu era? Era a mãe de um menino de nove anos chegando em casa. Era a dentista do Centro de Saúde terminando o expediente. Era a esposa retornando para o lar. Era a filha encontrando sua mãe. Esqueci esse último papel e assumi os outros três. Comovida com minha necessidade de proteção, apenas endureci. E lembrei de uma frase numa palestra da Rosely Sayão na escola do meu filho: “Onde tem afeto, é mais difícil”. E percebi o quanto a comunicação falha quando há afeto envolvido.

Queremos colo, mas dizemos que estamos cansados. Desejamos ser ouvidos, mas falamos com aspereza. Temos medo, e em vez de buscar um refúgio, nos irritamos com facilidade. Estamos sensíveis, por isso endurecemos.

Somos grandes e pequenos ao mesmo tempo, mas só mostramos uma face, nem sempre a melhor. Manter certa distância de nossos sentimentos facilita o diálogo, mas não traduz quem somos de verdade.

De verdade somos seres complexos, antagônicos, que se alegram com facilidade e perdem o humor no instante seguinte. Tem dias em que tudo se encaixa, como peças de um quebra cabeças perfeito, e outros em que nos perguntamos pra onde estamos indo realmente. Talvez aprender a lidar com a transparência de nossos sentimentos, sendo sinceros no diálogo com quem nos importamos de verdade, seja a chave para nos comunicarmos melhor.

Nossa grandeza diz que somos dignos de amar e sermos amados, que estamos no rumo certo, que podemos desejar um monte de coisas, que tudo é possível para quem tem fé, que um dia ruim é passageiro, que a vida é muito boa, que é bom ter a casa cheia, que nunca é tarde para investir num sonho, que somos seres que necessitam de amigos. Nossa pequeneza nos coloca em dúvida em relação ao presente e futuro, nos amedronta diante da novidade, nos afasta das pessoas, diminui nosso amor próprio, afugenta a proximidade dos outros.

Mas ninguém é uma coisa ou outra. Tanto a grandeza quanto a pequeneza têm espaço dentro de nós, e vêm à tona sem que nos programemos para isso. Então o negócio é nos conhecermos melhor _ e aprendermos com os erros. Quem sabe assim a gente se habitue a buscar a realidade recheada de verdade, e descubra que um cansaço é só um cansaço, e não precisa ser mascarado com frieza e distanciamento. Que a vontade de ganhar um abraço muitas vezes tem que ser dita, e que isso não diminui a validade do gesto. Que querer um colo de vez em quando é normal, e nos aproxima um tanto também. Que a tristeza existe, e acusa um monte de verdades que precisamos parar para ouvir. Que depois de senti-la por inteiro, ela vai embora.

E que só quem não tem medo de ficar triste consegue ser feliz por inteiro.

*Imagem: Via Tumblr

Fabíola Simões

Fabíola Simões é dentista, mãe, influenciadora digital, youtuber e escritora – não necessariamente nessa ordem. Tem 4 livros publicados; um canal no Youtube onde dá dicas de filmes, séries e livros; e esse site, onde, juntamente com outros colunistas, publica textos semanalmente. Casada e mãe de um adolescente, trabalha há mais de 20 anos como Endodontista num Centro de Saúde em Campinas e, nas horas vagas, gosta de maratonar séries (Sex and the City, Gilmore Girls e The Office estão entre suas preferidas); beber vinho tinto; ler um bom livro e estar entre as pessoas que ama.

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