Segunda feira, próximo jogo do Brasil, é seu aniversário. Me alcançou nos quarenta, mesmo sendo ainda recente a lembrança da Copa de 94, há tanto e tão pouco tempo, em que comemoramos juntos o tetra e nossos 20 anos, em Alfenas, ao lado da turma que naquela época formava uma grande família.
Vinte anos se passaram e hoje, conversando pelo Whatsapp, lembrei da gente sentado no fundão, escrevendo letras da Legião nas abas dos cadernos, trocando mensagens em papeizinhos rasgados, barganhando confidências em baixo tom. Os recursos mudaram, não tem como negar que facilitaram muito a rotina, mas naquele tempo a proximidade levava vantagem, e a gente conhecia o outro só de olhar.
Assim aprendi a conhecer você. E muito mais que me apresentar à “menina com uma flor” de Vinícius, ou escrever paródias a partir dos textos de Drummond, nos identificamos no olhar perante à vida. Um olhar carregado de significado para as coisas simples; mas no nosso entendimento, muito valiosas.
Nossa amizade por exemplo. Um dia, sentados embaixo de uma árvore, você, Déia e eu confabulamos um daqueles pactos que só os muito jovens têm a capacidade de conceber.
Anos depois, numa estrada rumo a Minas, você lembrou. A situação era oposta_ o que nos unia era uma dor sem nome_ mas éramos novamente os três, amadurecendo e tentando aprender a viver aos quase quarenta.
É isso que eu sei que importa pra você. E é isso o que importa para mim também. Por isso hoje, enquanto nos falávamos por msgs, recordei os bilhetes durante as aulas de somatologia ou materiais dentários. Lembrei que as letras de Renato Russo tinham o poder de nos curar e a trilha de Andréia Dória traduzia muito mais daquilo que vivíamos do que éramos capazes de verbalizar. E embora hoje você tenha crescido, aquela letra ainda diz algo sobre você, sobre nós e sobre os caminhos que trilhamos para chegar até aqui.
De vez em quando parece que escolhemos a estrada errada, apesar de todos os avisos _ placas, como você preferir_ bem à nossa frente; mas você sabe, e eu sei que você compreende, que não vai ser sempre assim. Já vivemos o suficiente pra cair, levantar, cair novamente e saber que nada é definitivo, feliz ou infelizmente.
Como naquela tarde, em que voltávamos da fazenda da Déia, cada um lidando com a tristeza do jeito que podia, sem imaginar que no ano seguinte _ esse ano _ brotariam frutos para selar os fragmentos da árvore partida… Da maneira mais linda e surpreendente, aprendemos que tudo pode terminar e começar num piscar de olhos. Que a gente pode sim se rearranjar novamente, mas é sempre do jeito que dá _ costurando, arrematando, remendando, apertando e afrouxando.
Então o que eu queria lhe desejar é esperança. Se não a mesma esperança que tínhamos lá atrás, quando algo não saía conforme o combinado e a gente acreditava que ‘pra tudo dá-se um jeito’ ou que faríamos ‘diamantes de pedaços de vidro’; pelo menos o desejo de que saia ileso da descrença, da desilusão. Que não amargue suas convicções nem subtraia a delicadeza do olhar. Nem tudo caminha conforme o combinado, algumas tristezas e perdas são irremediáveis, mas o saldo é descobrirmos que a existência é cheia de ciclos e recomeços.
O que posso afirmar é que estamos juntos, como sempre estivemos. E que lembro também. Lembro da Copa de 94, do trio elétrico nas ruas de Alfenas, dos conselhos que me oferecia de graça, do tempo em que me fazia de cupido pra fingir que te ajudava também.
Hoje lhe dou essas lembranças de presente. E aí quem sabe, perdido nessas divagações, talvez se recorde do olhar que tínhamos sobre você. O olhar que lhe fazia enxergar-se de uma forma mais generosa também, pois refletia algo além das imperfeições cotidianas.
Então pode ser que assim resgate um pouco da leveza do menino que foi; o menino que imitava o Bono Vox tendo como microfone uma fôrma de misto quente e escrevia nas últimas folhas do meu caderno “quem inventou o amor, me explica por favor?”…
Feliz Aniversário!!!
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https://www.youtube.com/watch?v=hNKAY_3Yj00
Parabéns Fabíola, lindo texto, tocante e envolvente. Sendo também da minha geração, sinto que fala comigo também.