Um vento por dentro

Esse ano, na foto oficial de Natal que tiramos na sala de casa, haviam vinte e oito sorrisos. É claro que cabiam muito mais, mas a família cresce, ramifica, se despede ou se renova ano a ano, igual à casa de todo mundo. Sentados à frente, cinco meninos com idades entre quatro e sete anos _ nossos furacõezinhos _ sorrindo.

Na minha opinião _ e por mais que discordem de mim _ foram a graça do Natal.
Um dos meus momentos mais especiais aconteceu ao lado dessa turminha. Reunida no quintal com esses garotinhos de calças curtas, tentando conter um pouco a euforia que se apoderava com mais força a cada instante, começamos um diálogo acerca do Papai Noel, que chegaria dali a pouco. Um dos meninos, que já esteve na Finlândia e conhecera o “Papai Noel verdadeiro”, veio me contar que o nosso era bem diferente. Concordei com o rapazinho; antes porém, fui categórica: “o nosso pode até ser mais simples, mas arrepia mais…” Ele concordou. Continuei dizendo que na hora que sentissem um vento diferente, podia ser que chegava a hora. Foi então que ouvi a frase: “Eu já estou sentindo o vento. Mas é um vento por dentro…” _  era o mais velho falando. Em seguida, quase em coro, todos começaram a dizer: “Eu também sinto! Um vento por dentro!”… e correram.

Naquela hora entendi. Enquanto alguns adultos se impacientavam com a hora de servir a ceia, preocupados com o tempo de cozimento do chester, com a quantidade de alimentos que inevitavelmente iria sobrar, ou se descabelavam diante do barulho das crianças (fazendo, eles mesmos, mais barulho que elas), cinco meninos sentiam um vento por dentro. Um vento que marcava a infância de cada um, trazendo a certeza de que aquela seria uma noite eterna.

Então, sensibilizada por esse “vento por dentro”, varri pra fora ausências, dores _ que senti ou testemunhei_, mágoas e irritações. Pedi a Deus que me ajude a ser menos esponja e mais espelho _ um espelho que reflete, e não toma pra si. Porque esse “vento por dentro” tem que preencher e não dar espaço pra tanta bobagem que se ouve e absorve por aí, pra tanta intolerância com o diferente, tanta falta de paciência com o incontrolável.

A exemplo de Drummond, desejo um olhar novo. Um olhar novo para os dias indomáveis, para as saudades intransponíveis, para o desenrolar das horas normais. Que possamos encontrar alento na simplicidade, na possibilidade, na imperfeição. A vida tem sua própria personalidade; vai mudando tudo de lugar, mexendo aqui, reformando acolá… Sabedoria é aceitar esse humor variante que a existência tem, e tolerar tudo com paciência e jogo de cintura.

Que em 2014 possamos sentir esse “vento por dentro” feito criança em noite de Natal. Que possamos nos encantar com as pequenas coisas, e a falta de tempo não abafe o que temos de melhor, que é esse sopro divino que nos habita e que poucas vezes nos permitimos sentir. Simplesmente sentir…

FELIZ VENTO NOVO!!!!!

Fabíola Simões

Fabíola Simões é dentista, mãe, influenciadora digital, youtuber e escritora – não necessariamente nessa ordem. Tem 4 livros publicados; um canal no Youtube onde dá dicas de filmes, séries e livros; e esse site, onde, juntamente com outros colunistas, publica textos semanalmente. Casada e mãe de um adolescente, trabalha há mais de 20 anos como Endodontista num Centro de Saúde em Campinas e, nas horas vagas, gosta de maratonar séries (Sex and the City, Gilmore Girls e The Office estão entre suas preferidas); beber vinho tinto; ler um bom livro e estar entre as pessoas que ama.

View Comments

  • Ola Fabiola !!
    Primeiro de tudo te desejo um Feliz Ano Novo ooops ! Feliz Vento Novo ! ;-)
    Adorei essa mensagem...me tocou muito e acho que sinto ainda mais pela falta da família que esta no Brasil...desejo também ser menos esponja e mais espelho ...nossa ! quando li isso, caiu direitinho pra mim, preciso aprender ...acho que essa sera minha resolução para 2014 ! vou imprimir essa mensagem e colar na geladeira, ler todos os dias ! Gros bisous de la Provence, Petria

  • O encanador te deixou na mão
    Tem reunião do condomínio
    O telefone não dá linha
    E o chuveiro tá dando choque
    Tem uma barata voadora no quarto das crianças
    E os monstrinhos estão gritando alucinados
    P'rá eles tudo é diversão
    Mas você sabe o que é ter pavor, pavor, pavor...
    De baratas voadoras

  • Uma que ouvi de outro furacãozinho, quando na água do mar eu disse que estava com frio:
    "_ não sente a água, deixa a água te sentir."
    Vento-poema!

  • Oi Petria! Feliz ano novo pra vc e sua família também! Mesmo longe do Brasil, que sua saudade seja apaziguada e haja muita alegria nos seus dias! Obrigada por sua presença sempre tão carinhosa aqui, e sim, vamos lutar para sermos menos esponja... difícil mas necessário, né? Feliz ano novo, cheio de saúde e paz! Bjs!!!!

  • Olá! Sempre venho aqui me "embebecer" com teus saberes... Permita-me...assim como não gostas de não ser referenciada, é bom referenciar as fotos que usas! Abraços.

  • Olá! No rodapé do blog há uma nota em que coloco que não sei a autoria da maioria das fotos. Foram baixadas do google, pinterest ou tumblr. Essa, que ilustra esse texto, retirei do google, de sites que também reproduziram sem citar a autoria. Porém, também coloco na nota que se você for dono ou autor de alguma dessas imagens, por favor me diga que faço a devida referência. Concordo com você e ficarei mais atenta daqui pra frente! Abraços!

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