De vez em quando acontece: um dia perfeito_ pouco sol, temperatura amena, céu limpo, brisa suave. Daí vem um fundo musical, uma decoração singela, gestos delicados, vista espetacular. Pra qualquer canto que se olhe, há poesia. Até uma pedra no chão, parece que foi premeditadamente colocada ali. E a gente percebe que faz parte da perfeição também. Que nosso colorido encaixa, e nosso coração também. E tudo fica tão bonito e singelo, que corre-se o risco de achar que está sonhando. Ou então que morreu e foi pro céu.
De repente, no meio disso tudo, um menino vestido como um príncipe senta-se num balanço_ enfeitado com fitas coloridas que dançam à mercê do vento_ e fica a observar uma rosa que acabou de pegar no chão. O menino embala-se delicadamente e olha a flor, se fixa nela, passa a mão no caule, observa com olhos de novidade, tentando decifrar alguma coisa que só a natureza pode traduzir em sua perfeição. Ele percebe o cheiro das pétalas, sente a textura no rosto, volta a conferir o caule; presta atenção nos espinhos. E eu constato surpresa que, quando achava que nenhuma rosa poderia me falar mais, a imagem do menino que se entretém e pensa coisas que eu não sei contar, me comove de um jeito novo, inimaginável. Porque virão outras rosas e outros espinhos em sua jornada, mas talvez pra mim _ e só pra mim_ essa rosa será o símbolo de um momento assim_ perfeito.
Lá na frente, um noivo comovido lê seus votos. E o sol das quatro da tarde _ leve, morno, despontando acanhado atrás das nuvens pra confirmar que foi contra as previsões de chuva e a favor das promessas à Santa Clara_ ilumina o rosto do jovem. Ele se declara falando acerca de coisas que só o coração pode entender e a noiva conta um amor que começou há 21 anos, quando ainda eram crianças. Então o padre, traduzindo toda a atmosfera, fala a língua dos poetas citando Milan Kundera, Nietzsche, Renato Russo e Vinicius de Moraes.
E a gente aprende que de vez em quando a vida faz sentido; e mesmo que não consiga explicar porque, consegue colocar algumas peças soltas no lugar, perdoando aqueles reveses que fizeram parte do caminho e acreditando que no final das contas, viver não é tão complicado; difícil é encontrar alegria e satisfação nos pequenos gestos…
Então encontro na rosa do menino a metáfora que me reconecta à minha sabedoria interior, aquela que todos nós temos mas deixamos esquecida diante da imperfeição diária e do barulho interno. Mesmo correndo o risco de soar clichê _pois ainda assim, pra mim e para o menino, a experiência é primeira_ esses novos horizontes que se descortinam me fazem entender que existem e existirão espinhos, mas nem a aparência ou o medo de ser espetado podem afastar o que de belo existe; e não conseguem esconder a beleza, e o fascínio, e a alegria do todo, que é simplesmente o viver.
Imersa nesses pensamentos, e ainda comovida com a poesia dos protagonistas dessa tarde inesquecível, me surpreendo uma vez mais, ao som dos violinos que encerram a cerimônia enquanto balões coloridos sobem ao céu, perfeitamente emoldurado pelo cenário do Pão de Açúcar à esquerda e o Cristo Redentor à direita. Lembro Renato Russo, e a canção “Dia Perfeito” me vem à cabeça. Embora a música seja outra, meu coração canta silenciosamente: “Podem até maltratar meu coração, que meu espírito ninguém vai conseguir quebrar…”
E enfim desejo aos noivos: Que lembrem um ao outro esse dia. Que recordem as promessas à Santa Clara e entendam, segundo as palavras do noivo, que poderia até ter chovido, mas o casamento aconteceria de qualquer jeito.
O casamento acontece também _ e talvez mais ainda_ quando a gente se permite viver mais um dia e confirma as promessas nas horas mais difíceis_ naquelas, em que não haverá sol nem vista espetacular_ ao permanecer_ e criar raízes_ quando nem tudo for tão bom ou perfeito.
E aí quem sabe, depois de alguns anos, vocês encontrem novamente um dia assim_ perfeito_ e entendam que valeu a pena ter permanecido…
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