Ontem, primeiro de janeiro, foi dia de posse dos prefeitos eleitos. Pela primeira vez, compareci a uma cerimônia de posse _ o novo prefeito de Campinas foi meu vizinho e nossas famílias se aproximaram informalmente. Enquanto assistia à solenidade e ouvia os discursos, pensava na dificuldade que há em tomarmos posse de nós mesmos.
Nos conhecemos muito mal. E temos a lamentável tendência de sairmos de nosso centro para cuidarmos da vida alheia_ como se isso fosse remédio para nossa pouca habilidade de lidar com as próprias carências. Fugimos de nosso governo e vamos despachar em outras praças, mandando e desmandando em gabinetes que não nos pertencem, mas que insistimos em manter o expediente, como funcionários picando o cartão.
Nesse ano que se descortina cheio de promessas, tome posse de si mesmo. Aprofunde em seu mistério e lide com o mel e o fel de sua essência. Entenda que seu trono não pode ficar vago enquanto você abdica de si mesmo. É preciso que assuma seu espaço, esse lugar no mundo que lhe pertence, quer você queira ou não, com todas as boas e más notícias.
Se cada qual se colocasse no próprio lugar, haveria mais espaço pra todo mundo aprender_ cair e se levantar_ respirar, evoluir, viver. Nosso lugar pode sim, ser melhor se a gente trabalhar para isso. Se eu souber a receita que me faz feliz, me torna pacífico ou me traz conforto_ apesar dos pesares_ e seguir a receita à risca, já serei companhia melhor para os meus. Porém, se eu preferir ciscar por outras praças, surfar na superfície de mim mesmo, nunca habitando meu próprio lugar no mundo, seguirei descuidado de meus anseios, impaciente com minhas dificuldades, raivoso, intolerante e muito ranzinza. Certamente serei um fardo para aqueles que me amam, uma pátria sem governante, um trono sem rei.
Não imagine seu lugar fora daquele que lhe foi reservado. Desacostume-se com frases do tipo “no seu lugar…” pois quem diz isso não imagina, nem de longe, o que é ser o outro.
Queixamos da falta de tempo quando nos dedicamos demais ao desnecessário.
Desperdiçamos tempo e energia acompanhando, palpitando, sendo “úteis” _ até demais!_ àquilo que não nos requer. É claro que nossos filhos precisam de nós; porém, não como eternos cuidadores de seus caminhos e sim ensinando-os a cuidarem, eles mesmos, das próprias vidas. Ensinando-os, principalmente, com o exemplo. Exemplo de zelo com nossas próprias necessidades_ do corpo e da alma. E deixando-os livres, donos de si mesmos, enquanto permanecemos em nossos lugares: espectadores de suas jornadas… Esse é um dos maiores legados que podemos deixar.
Tome posse de seu governo e vá em busca de suas respostas. Nada pode lhe perturbar se você não permitir. O que mais lhe incomoda não está fora, e sim dentro de você. Viaje para dentro de si mesmo e encontre riquezas por trás das aparentes clarezas. Descubra as razões que te tornam um governante tirano ou compassivo demais. Encontre equilíbrio no domínio e submissão, na disciplina e rebeldia, no caos e organização. Ame-se além do bem e do mal, perdoe-se, tolere-se. Encontre caminhos que lhe conduzam à realização de seus anseios, encare o medo de frente e não busque camuflá-lo com tirania, controle excessivo ou autoridade sem propósito. Cuide do que é seu, valorize-se na medida certa. Guarde seus tesouros e não exponha em praça pública aquilo que lhe é mais caro.
Não dependa dos outros para ser feliz nem ampare seus desejos nas circunstâncias alheias_ a frustração vem a galope. Respeite seus limites e proteja seu espaço. Controle as visitas e não permita que seu gabinete se torne “a casa da mãe Joana”.
Tome posse de si mesmo. Seja firme, positivo, centrado. Assine, carimbe e autentique tudo aquilo em que tem fé. Assuma, principalmente, a fé em si mesmo.
Lembre-se que o mandato deles dura quatro anos. O seu, é vitalício _ e pode acabar a qualquer momento…
Bom governo!
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Parabéns pelo texto, inteligente e oportuno!
Muito bom.....