Ainda de férias, escrevo da areia da praia, olhando para o mar do Recife, onde meu filho e marido se divertem pulando ondas enquanto ensaio um mergulho, mas me arrisco só até onde a água toca minha cintura, pois o frio que chega em ondas esparramadas e dispersas me paralisa.
Com vontade de mergulhar mas sentindo as pernas arrepiarem com o vento que chega, volto prá canga e me pergunto que frio é esse que me impede de viver por inteiro?
Observo meu filho e escuto ao longe sua risada barulhenta, vejo os bracinhos abertos onde o clarão do sol brinca, os cabelos molhados de mar, sal e areia. E o que me impede de viver a vida que convida com seus sabores, alegrias e calores é só o desconforto de um frio passageiro e paralisante…
Por que é tão difícil sairmos de nossas zonas de conforto_ que podem nem ser tão confortáveis assim_ mesmo sob o sol quente rachando a pele, mesmo sabendo que logo ali à frente há promessa de mais alegria e menos frio?
Porque ser livre é mérito dos que têm coragem. Uma conquista dos que rompem o vínculo com a culpa e experimentam suas próprias leis_ já que a liberdade é almejada mas também complicada. Difícil como ter o oceano à frente e não saber o que fazer com ele. Acreditar no prazer que existe em estar submerso e ter medo de água fria. Enxergar a beleza, admirar a coragem dos que se arriscam e preferir ficar na areia observando com brandura e pouca bravura.
Esquecemos que somos livres. Preferimos culpar a água gelada, o vento que chega sem avisar, a sombra que surge do nada. Esquecemos que dentro de nós tem sempre um sol que aquece, uma água morninha convidando pra um mergulho, uma noite iluminada.
Optamos em ser apenas observadores, sentados em cangas esperando pela vida que acontece de verdade fora de nós. Enquanto isso, sempre haverão meninos de pele morena rindo ao sabor do mar, nos mostrando que perdemos tempo com previsões, limites, juízos e regras inúteis enquanto a vida escapava gentilmente como areia descendo pelos dedos.
Porém, liberdade não é para amadores, para quem não se conhece. Ao contrário, é coisa de gente séria, que se arrisca com responsabilidade e tem coragem de avançar e também recuar, de quem percebe a agitação do mar e não vacila com a própria vida. Pois ser livre não tem a ver com se atirar descontroladamente e sim se conhecer, aprofundar no mistério que habita e entender de si mesmo sem julgar, não apenas surfando na superfície da vida mas sim procurando respostas, encontros, disposições.
É preciso duvidar para depois acreditar. Entender o que se deseja para então desejar. Conhecer o que te completa, te limita, te faz feliz para assim descobrir o caminho. Não seguir o padrão mas entender seu jeito único de ser. Não invejar os que se agitam no mar quando lá no fundo você não suporta areia e sal. Descobrir que se é livre para ser você mesmo ainda que esteja num relacionamento de anos e não saiba mais quem é de fato. Entender-se único, capaz, merecedor. Acreditar que sempre é possível recomeçar _ nos afetos, nos projetos, nas novas formas de ver a vida_ e que podemos ter boas surpresas em qualquer estágio da jornada.
Quanto a mim, ainda não sei lidar direito com a liberdade que existe dentro de mim como eterno verão em tempo de férias. Ainda carrego culpas, limites, nuvens carregadas e por isso hesito tanto antes de cair nos braços do mar. Mas ainda assim, venço meus julgamentos e o frio calculista pois sei que na imensidão do oceano sou mais feliz do que permanecendo como mera espectadora sentada na areia. Sem mais pensar, deixo o bloquinho de anotações e desato a correr, pulando ondas, mergulhando de cabeça e gritando:” Tô chegando!!!!”
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Inteligente, maravilhoso!